Escrevo minha última coluna do ano com o tema que imaginei abordar em dezembro de 2025. É de esperar que, no ano que antecede as eleições presidenciais, as incertezas fiscais —amplificadas por um aumento expressivo dos gastos públicos— gerem um cenário altamente volátil, levando investidores a tomar decisões, ou adiá-las, com base nas possíveis trajetórias da política econômica futura. A surpresa, no entanto, é que esse cenário se materializou já em 2024. Dois anos de incertezas são muito tempo para qualquer economia.
Na realidade, o arcabouço fiscal criado em 2023 —projetado para funcionar como uma âncora mais flexível a fim de substituir o teto de gastos— trouxe consigo regras que o tornariam incapaz de garantir sua própria sustentabilidade. Portanto, não deveria ser surpreendente a crise de confiança a que estamos assistindo. A verdadeira surpresa reside na falta de percepção política de que a resistência em adotar, neste momento, medidas rigorosas de contenção de gastos comprometerá as condições mínimas de estabilidade econômica até as eleições de 2026.
Estamos prestes a encerrar o ano com um dólar acima de R$ 6, um ciclo de alta das taxas de juros projetado pelo mercado acima de 16,5%, e as empresas listadas no mercado extremamente descontadas. Sob tais condições, será difícil evitar um ano marcado por alta da inflação, desaceleração do crédito, aumento do desemprego e queda na confiança de empresários e consumidores. Nossa taxa de investimento, atualmente em um dos menores níveis históricos, tende a contrair-se ainda mais nos próximos dois anos.
Com preços dos ativos tão deteriorados, caso o atual arcabouço seja reforçado e preservado até pelo menos 2026, poderíamos ao menos atravessar esse período de forma menos turbulenta. Contudo, para que isso aconteça, seriam necessárias medidas mais robustas do que as anunciadas e diluídas pelo Congresso, como mudanças estruturais no desenho do BPC, no seguro-desemprego e nas regras de desindexação dos gastos obrigatórios. Somente o presidente tem liderança política para levar essa agenda adiante, que é de responsabilidade do Executivo.
As recentes intervenções do BC no mercado cambial e do Tesouro recomprando títulos públicos trouxeram algum alívio, mas não alteram o fundamento subjacente dessa crise. Atualmente, o nível de nossas reservas não é tão confortável quanto em 2013 e 2014, quando realizamos intervenções significativas. Por parte do Tesouro, o colchão de liquidez é limitado, e os vencimentos das dívidas se aproximam.
Enquanto o meio político, incluindo o Congresso, não se atenta ao prognóstico para nossa economia, o cenário internacional se agrava. Recentemente, o Federal Reserve sinalizou que reduzirá as taxas de juros de forma mais moderada do que o esperado no início do ciclo, consolidando a expectativa de que o dólar continuará forte e impondo um limite maior para os juros globais.
O BC está ciente da adversidade do cenário, ao destacar seu compromisso com a meta de inflação, utilizando o único instrumento à sua disposição: a taxa de juros. Contudo, não há cenário em que o BC consiga cumprir sua função de maneira eficaz sem âncora fiscal.
Sem ações vigorosas no controle dos gastos, colheremos os frutos de uma crise de confiança que se desenhava para 2026. E a grande pergunta que se coloca é: como atravessaremos os próximos dois longos anos?
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