Na última eleição presidencial dos Estados Unidos, Donald Trump venceu Kamala Harris em um contexto econômico que, aparentemente, favorecia o partido no poder. O governo Biden apresentou forte crescimento do PIB, com uma taxa de 5,9% em 2021, desacelerando para 1,9% em 2022 e 2,5% em 2023, e mantendo-se positivo em 2024. O desemprego estava em níveis historicamente baixos, e o mercado de ações permanecia estável.
No entanto, muitos eleitores não viam a economia com o mesmo otimismo que os dados macroeconômicos sugeriam. Esse descolamento entre os números oficiais e o sentimento popular levanta questões sobre como fatores ocultos nas métricas econômicas afetam a percepção dos eleitores.
O estudo “The Cost of Money is Part of the Cost of Living”, de Lawrence Summers e colegas, oferece uma chave para entender essa desconexão. Os autores mostram que, embora a inflação esteja controlada, o aumento das taxas de juros tem impacto direto na percepção dos eleitores sobre o custo de vida. Eles explicam que o índice oficial de preços ao consumidor (CPI) não inclui os custos de empréstimos —como os de hipotecas e financiamentos de carros —que pesam fortemente sobre o orçamento familiar. Assim, enquanto os economistas enxergam uma economia sólida, os consumidores experimentam uma realidade diferente, marcada pelo encarecimento do crédito.
Na década de 1970, o economista Arthur Okun incluía as taxas de juros no seu “índice de miséria”, que capturava melhor os efeitos do custo do crédito no orçamento doméstico. Contudo, essa metodologia foi revista em 1983 pelo Bureau of Labor Statistics (BLS), que removeu os juros do cálculo da inflação oficial, baseando-se apenas nos valores de aluguel para mensurar o custo da moradia. Embora mais estável, essa mudança tornou o índice desconectado da experiência dos consumidores, que sentem no bolso o impacto das taxas de financiamento.
Então, para muitos eleitores, o custo do crédito se tornou um elemento central na avaliação econômica, influenciando o pessimismo mesmo em um cenário de crescimento e desemprego baixo. Afinal, para uma família americana média, comprar uma casa é o maior investimento de vida. Contudo, com a alta das taxas de juros, as parcelas de financiamentos imobiliários triplicaram desde os níveis baixos de 2021, e os pagamentos mensais de empréstimos para carros aumentaram mais de 80% desde o início da pandemia. Esses custos, ignorados pelos índices tradicionais, pesam no orçamento e criam uma desconexão entre o índice de inflação calculado pelos economistas e o custo de vida percebido pelos cidadãos.
O estudo mostra que essa disparidade entre dados oficiais e percepção popular ocorre em outros países onde o crédito ao consumo é amplo e os juros subiram, gerando pessimismo econômico mesmo com a inflação controlada. Além disso, o aumento dos juros impacta o mercado imobiliário: financiamentos ficam mais caros, afastando compradores e criando um efeito de “lock-in”, no qual proprietários ficam presos a suas casas por não conseguirem financiar outro imóvel com juros mais altos. Esse aprisionamento reduz a mobilidade e agrava a percepção negativa sobre a economia.
Nesse cenário, o eleitor americano vota com uma visão que não é capturada pelas métricas. Enquanto economistas acompanham inflação e desemprego pelos índices tradicionais, os eleitores sentem o peso do custo do dinheiro. Para eles, o que importa é o custo de manter uma casa, financiar um carro e pagar contas, isto é, em tempos de juros altos, os dados econômicos convencionais podem não estar calibrados para refletir a experiência real do cidadão comum.
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