A malandragem arquitetada para destravar o pagamento de emendas parlamentares representa mais do que um dia comum na relação entre Planalto e Congresso. Ao definir regras que garantem a liberação do dinheiro no apagar das luzes de 2024, o governo Lula fecha um acordo generoso com o centrão para a segunda metade deste mandato.
O bloqueio imposto por Flávio Dino à farra das emendas colocava detonadores na estrutura de escoamento de verba montada pelo Congresso nos últimos tempos. O governo não escondia que enxergava a decisão como uma oportunidade para recuperar o poder sobre a distribuição de recursos em troca de apoio em votações na Câmara e no Senado.
O Planalto deu um passo atrás ao perceber que não seria capaz de vencer essa guerra, nem mesmo com o apoio do STF. A ameaça pública de paralisia das operações políticas de interesse do governo foi suficiente para convencer Lula a preservar engrenagens importantes do arranjo que abastece os parlamentares.
A portaria do governo empurra o Congresso na direção de alguma transparência na indicação da verba e dá uma certa discricionariedade ao Planalto para abrir e fechar a torneira de pagamentos, mas deixa brechas suficientes para manter parte da festa. Uma delas permite que as emendas de comissão continuem a ser fatiadas pelos mandachuvas do centrão, agora camufladas sob a assinatura de líderes partidários.
O acerto não é só um ajuste burocrático desse balcão de negócios e indica que o governo voltou a sentir a necessidade de oferecer uma abertura maior para o Congresso. Não por acaso, o pacto coincide com a volta de rumores de que Lula poderia nomear um deputado do centrão para chefiar a articulação política, o que facilitaria ainda mais a distribuição das emendas.
O acordo também foi fechado com a cortesia de outra coincidência, que desnuda a desfaçatez do centrão. Na segunda (9), o deputado Elmar Nascimento avisou que a pauta de votações estava travada pelo bloqueio dos pagamentos. No dia seguinte, um primo do parlamentar foi preso numa operação contra o desvio de emendas, depois de jogar uma sacola de dinheiro pela janela.
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