A iraniana problemática – 05/11/2024 – Mariliz Pereira Jorge

Nos Estados Unidos, Kamala Harris disputa voto a voto e pode se tornar presidente. Durante a campanha, o debate sobre direitos reprodutivos jogou no colo da candidata democrata eleitoras que se identificam historicamente como republicanas, mas entendem que o retrocesso em relação ao aborto não deve ser tolerado.

No raio X do eleitor, mulheres estão mais à esquerda e homens mais à direita. A influência paterna ou marital perde espaço nas decisões políticas femininas, pautadas, sobretudo, por questões que passam pela defesa da igualdade de gênero, combate à violência e garantia de representatividade.

No Irã, uma ditadura teocrática, a imagem que circulou nas redes nesta segunda (4) foi a da estudante Ahoo Daryaei. Segundo os relatos, ela teria sido repreendida pela polícia moral por não usar o hijab (véu) de forma adequada, na Universidade Islâmica Azad. Não é uma notícia velha. É só mais um capítulo na história de repressão vivida pelas mulheres iranianas, que já fez dezenas de vítimas nos últimos dois anos.

O enredo é o sempre o mesmo. Um véu mal colocado, uma mulher assediada, presa, espancada, morta. Outras que enfrentam a repressão, desaparecem e depois são vítimas de acidentes fatais. O que se sabe sobre Ahoo são informações de jornalistas e ativistas iranianos exilados. Ela teria se despido, em protesto, depois de uma abordagem violenta da polícia moral.

As imagens mostram a estudante caminhando pelo campus apenas com as roupas íntimas, numa postura de confronto. Os comentários sobre a cena se repetem: medo por ela. O destino de Ahoo, segundo o governo, foi a transferência da delegacia para um centro de tratamento psiquiátrico, por ser “problemática”, discurso endossado pela universidade.

Num mundo livre, mulheres também são chamadas de loucas quando não atendem a expectativas, mas já podemos protestar, lutar por leis que combatam a violência, exigir mais igualdade, sem que sejamos arrastadas, espancadas, trancafiadas como criminosas e mortas como seres descartáveis. Ahoo Daryaei já se tornou uma imagem da resistência contra opressão feminina, mas talvez vire também mais um nome numa estatística macabra. A democracia é o único lugar um pouco mais seguro para as mulheres.


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