“Preciso nadar no Rio Sena!”. Essa foi a reação logo quando descobri que iria para as Olimpíadas de Paris. Estranho? Talvez, mas tem explicação.
A principal “propaganda” do comitê organizador era que um dos cartões postais da França seria despoluído para abrigar as competições de triatlo e maratona aquática. Depois, voltaria a ser liberado para banho e utilização pela população da Cidade Luz. Logo, isso se tornaria o principal legado dos Jogos Olímpicos de 2024.
Acontece que esse tema virou polêmica porque, a menos de um mês do início das competições, os índices indicavam que a água estava imprópria para o banho, parte em função do alto volume de chuvas na capital francesa.
Então, o “caso Rio Sena” furou a bolha do esporte e ganhou atenção de todos. Ele vai ficar limpo a tempo? Será seguro nadar lá? De fato, não tem nenhum tubarão? Um filme de ficção recente viralizou e “levantou” esse debate…
Enfim, vamos voltar para a realidade, que apontava para outra questão: quem teria coragem de nadar no rio poluído e impróprio para banho? O presidente da França Emmanuel Macron disse que mergulharia; a prefeita de Paris prometeu o mesmo; e eu também falei para alguns amigos.
Apoiados em um novo estudo feito dias antes da abertura, Anne Hidalgo, prefeita da cidade, se arriscou nas águas do Sena. Macron não. E eu? O vídeo que abre esse texto já denuncia que sim.
Enquanto a prefeita conseguiu acesso ao Rio Sena na altura da Ponte Maria e do Cais dos Celestinos, eu tive que procurar uma entrada “alternativa” para as águas porque esse local estava fechado para a cerimônia de abertura – que também será no rio, só que os atletas vão desfilar em barcos.
Meu companheiro de trabalho Antônio Chamorro recebeu a informação de que alguns políticos iriam mergulhar no Canal Saint-Martin, zona leste de Paris, durante um evento com atividades voltadas para o verão, chamada “Praias de Paris”.
O sonho estava vivo, então: junto com minha colega Mariana Capra, cruzamos a cidade em busca de um mergulho.
Como foi a experiência?
Chegamos no canal e, para a nossa surpresa, centenas de pessoas estavam nas margens do Sena, mas dentro… ninguém! Nem um “pezinho” na água; a maioria de sapatos, nas calçadas.
Será que naquela região era proibido? Fazia um pouco de calor, mas a água, escura, não muito convidativa. Decidimos, então, subir um pouco e “seguir” o canal para ver se encontrávamos o tal evento.
Depois de mais duas quadras, começamos a notar diversas bandeirinhas e mais pessoas próximas ao canal, bebendo, conversando e tocando instrumentos. Finalmente chegamos à terra prometida. Mas era possível nadar?
Olhamos e o máximo que vimos foram pessoas nas margens do Canal de St. Martin. Se ninguém estava na água, tampouco havia placas que proibissem a experiência – apesar do meu francês ser bem limitado.
Confesso ter pensado “escapei dessa sem sair como amarelão”. Mas o lado jornalístico também apareceu: será que a matéria caiu?
Até que avistamos homens nadando do outro lado do canal. Não tive dúvidas: era para acontecer! Enquanto Mariana aprontava o equipamento, me “arrumei para o mergulho”. Um calção vermelho e pouco na cabeça, sem pensar ou olhar muito para água.
Tchibum! Mergulhei, finalmente, nas águas do Rio Sena.
Sonho realizado e, conforme ia me refrescando, o medo ia passando e uma sensação de dever cumprido tomava conta de mim.
A água estava gelada, em uma temperatura próxima ao ideal para se praticar esportes. Se fosse muito quente, poderia atrapalhar os atletas por conta do calor. A cor era escura e eu não enxergava o seu fundo (apesar de ter menos de 3 metros de profundidade), mas ela parecia estar limpa. Claro, por ser um canal e estar rodeado de algumas vegetações, havia algas e folhas na água, mas nada que passasse a impressão de sujeira.
Na humilde experiência de quem já nadou no Rio Tietê, mas no interior de São Paulo (afinal, nasci e cresci em Bauru), as águas do Sena estavam aprovadas.
Dei algumas braçadas, mergulhei e nadei de uma margem a outra. Até reparei outras pessoas me filmando, como se realmente fosse uma grande novidade. Os outros banhistas já tinham saído da água, mas ainda estavam na margem tomando um pouco de sol.
Tudo estava bem até que um apito ensurdecedor ecoa na borda oposta por onde entrei. Um policial esbravejava comigo, gesticulava muito e acenava como se eu precisasse sair da água. Como meu francês é limitado ao sim e ao não, não entendi a bronca, mas subi pela mesma escadinha. Estava feita a matéria.
Nadei nas águas do Rio Sena a dias das Olimpíadas e sobrevivi.