Há apenas quatro semanas, o boletim Focus projetava Selic de 11,25% e inflação de 4% para 2025. Hoje, tais estimativas saltaram para 12,25% e 4,34%, respectivamente. Os preços de mercado seguem a mesma direção. As inflações implícitas para os próximos dois anos avançaram de cerca de 5,5% para 6%, enquanto a Selic projetada para o final de 2025 subiu de 13,5% para 14,25%.
Essa conjunção de juros elevados e inflação persistente reflete a atual combinação de políticas econômicas, que coloca o Brasil em risco de reviver novamente um quadro semelhante ao de 2015, quando enfrentamos inflação acima de 10% e recessão de quase 4%.
A inflação corrente está pressionada pela valorização do dólar, pelo encarecimento dos alimentos e por um consumo aquecido, que há meses mantém os preços dos serviços em patamares acima de 5%. Nos últimos 12 meses, o IPCA-15 alcançou 4,77%, enquanto a média anualizada dos núcleos de inflação está em torno de 4,5%. Com a percepção de que a inflação beira os 5%, ultrapassando o topo de tolerância da meta, ressurge o debate sobre uma possível revisão das metas inflacionárias.
É ilusão acreditar que a elevação da meta abriria espaço para juros nominais mais baixos. Esse suposto alívio é inexistente, pois o aumento da meta eleva as expectativas e enfraquece a eficácia da política monetária. Em vez de promover juros menores, essa discussão oculta a causa de suspeitarmos de que 3% seja uma meta ambiciosa: até hoje não conseguimos manter uma regra fiscal crível e eficaz por muito tempo.
Em um ambiente de forte dinamismo da atividade, expectativas desancoradas e inflação corrente acima da meta, a curva de juros já precifica uma aceleração para mais de 0,75 ponto percentual no ritmo de elevação da taxa Selic. Caso o Banco Central opte por uma convergência mais lenta da inflação à meta, com um aperto monetário mais moderado, isso pode intensificar o risco de maior desancoragem das expectativas e exigir um ciclo de alta ainda mais agressivo.
É difícil compreender a demora na apresentação das tão esperadas medidas fiscais. Ao postergar o ajuste, cresce a percepção de que não há senso de urgência por parte de quem precisa liderar essa agenda, elevando o risco de desidratação das propostas e o prêmio de risco. Esse contexto pressiona mais o câmbio e as taxas de juros, demandando um ajuste mais robusto do que o que parece estar na mesa hoje.
O ponto de partida deveria ser, no mínimo, o resgate do conceito original do arcabouço fiscal, impondo uma restrição efetiva ao crescimento dos gastos, não apenas buscar mais espaço para despesas discricionárias. Isso implicaria limitar o crescimento real das principais despesas (incluindo educação e saúde) a 2,5%, em linha com o teto da regra em vigor.
No entanto, para que a inflação convirja de fato para a meta, não basta desacelerar o crescimento da dívida pública. É essencial estabilizar sua trajetória, o que exige a retomada de debates estruturais mais profundos, como uma nova reforma da Previdência, uma reforma administrativa e a desvinculação abrangente das despesas obrigatórias. Somente assim uma meta de inflação de 3% será realmente crível.
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