Nos últimos anos, o Brasil alcançou progressos notáveis nos serviços digitais do governo, recebendo reconhecimento do Banco Mundial como o segundo melhor entre mais de 198 nações nesse domínio. Em 2022, cerca de três quartos dos 4.900 serviços federais estavam totalmente digitalizados.
No entanto, a oferta de serviços digitalizados não está sendo acompanhada pela demanda. Os dados da PNAD-C mostram que, em 2022, apenas 39% dos domicílios brasileiros acessaram os serviços digitais do governo. O principal motivo é que não possuem as habilidades necessárias para fazê-lo. Quase metade dos entrevistados indicou que não sabia usar a internet.
Além disso, pessoas que carecem de habilidades digitais enfrentam uma dificuldade maior. Muitas vagas de emprego são anunciadas principalmente em plataformas digitais, o que significa que o analfabetismo digital se torna uma barreira que dificulta o acesso das pessoas pobres ao mercado de trabalho.
Habilidades digitais básicas, como saber copiar e mover arquivos, transferi-los entre dispositivos e anexar documentos, são agora essenciais para que as pessoas possam se beneficiar da digitalização dos serviços públicos e melhorar suas chances de encontrar emprego. No entanto, essas habilidades não estão tão disseminadas entre os jovens brasileiros. Segundo o World Skills Clock das Nações Unidas, o Brasil ocupa a 119ª posição entre 168 nações em termos da proporção de jovens com habilidades digitais.
As disparidades em competências digitais da população brasileira são importantes em diversas dimensões, incluindo geográficas, intergeracionais e de renda. Dados da pesquisa TIC domicílios de 2023 mostram que a proporção de pessoas com ao menos uma das três competências referidas anteriormente alcança, por exemplo, 43% em áreas urbanas e 28% em áreas rurais.
Da mesma forma, entre jovens de 16 a 24 anos, o percentual é de 61% contra 12% entre os adultos maiores de 60. Entre aqueles em domicílios com renda familiar de até três salários-mínimos é 34%, comparado a 78% no grupo com renda superior a dez salários-mínimos. Há, contudo, segmentos do país com padrões globais: entre os jovens, urbanos, em domicílios de renda alta quase todos (97%) têm habilidades digitais. O problema é que esse é um pequeno segmento da população.
Neste 17 de outubro, o mundo comemora o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza; uma ótima ocasião para refletir sobre os desafios desta luta. O Brasil está diante de uma oportunidade até agora desperdiçada de utilizar o mundo digital para beneficiar os mais pobres.
É preciso investir em programas de formação de habilidades digitais que tenham foco em competências específicas demandadas pelo mercado de trabalho local. Além disso, devem considerar as necessidades de diferentes públicos-alvo, como jovens e idosos, e incluir treinamento sobre como buscar informações na internet e acessar serviços públicos digitais. Cursos rápidos e com uma combinação de teoria e prática parecem ser o melhor formato para intervenções efetivas de larga escala. O combate à pobreza precisa de ações em múltiplas frentes, mas o digital, sem dúvida, deve estar entre as prioritárias.
Esta coluna foi escrita em colaboração com meus colegas do Banco Mundial Cornelius Fleischhaker e Hugo Ñopo, economistas sênior para o Brasil, e Otávio Conceição, consultor.
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