Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque, estima ter levado pelo menos 200 mulheres ao local onde foram encontrados os corpos e ossadas de nove vítimas.
São também cerca de 200 as cartas que o condenado a um total de 280 anos de prisão chegou a receber por mês de mulheres que se declaravam apaixonadas pelo assassino confesso de 11 jovens, submetidas a estupro, tortura, canibalismo e necrofilia.
A trajetória macabra é retratada em 352 páginas de “Francisco de Assis, O Maníaco do Parque” (Matrix Editora, R$ 85), que chega às livrarias neste mês.
Após três best-sellers sobre mulheres assassinas, Ullisses Campbell mergulhou na história que ganhou as manchetes em agosto de 1998, quando o serial killer foi preso e chocou o país com sua confissão.
A biografia não autorizada é fruto de um trabalho investigativo de dois anos, entrevistas com 40 mulheres que sobreviveram ao maníaco, depoimentos de familiares e leitura de 20 mil páginas de processos e 12 laudos psiquiátricos.
Tarefa mais desafiadora por se tratar de um mitômano. “Fiz questão de em várias passagens salientar que ele tem diagnóstico de mentiroso compulsivo”, diz Campbell, autor da “Trilogia Mulheres Assassinas“, que inclui os livros “Suzane – Assassina e manipuladora”, “Elize Matsunaga – A mulher que esquartejou o marido” e “Flordelis – A pastora do diabo”.
Na balança entre verdades e mentiras estão os casos de abuso sexual que Francisco diz ter sofrido na infância.
“Quando eu tinha 12 anos, uma tia de 24 me pediu para beijar o seu sexo e chupar suas mamas”, revelou ele a psicólogos, quando relata outros dois episódios na infância envolvendo tios.
Um deles, aos 9 anos. “Estava dormindo e um tio materno entrou no quarto e se deitou ao meu lado. Ele introduziu o pênis no meio das minhas pernas várias vezes até gozar.”
A mãe nega. “Francisco inventa. Habita em um universo imaginário”, diz Maria Helena, que minimiza a influência do avô, tido como bruxo e charlatão, na personalidade maligna que o filho alega assumir ao cometer crimes.
“Ela tenta desconstruir o assassino. A negativa pode ser uma forma de proteger os familiares”, entende Campbell.
O biógrafo informou Francisco sobre o livro por carta. “Ele disse a uma fonte que não se iria se manifestar, pois vai escrever suas memórias.”
Francisco cumpre pena na Penitenciária de Iaras (SP). “Seus dentes pequenos, tortuosos, pontiagudos, amarelados e quebradiços – usados para atacar suas vítimas – caíram todos”, relata Campbell.
Somadas as condenações, ele estaria quite com a Justiça somente em 2274, lembra o autor. No entanto, o tempo máximo de cumprimento de pena no Brasil é de 30 anos, o que permitiria a soltura do Maníaco do Parque em agosto de 2028.
“Antes, ele deverá passar por mais uma bateria de testes psicológicos”, pondera o biógrafo.
Campbell ressalta que em duas ocasiões Francisco declarou que voltaria a matar fora da prisão. “Se eu for solto, vou acabar matando de novo”, disse. “Tenho medo apenas de mim.”
A seguir, trechos do livro, entre relatos de sobreviventes, violências sofridas no Exército e no cárcere e namoros com fãs com histórico de envolvimento com criminosos famosos.
RELATOS DE SOBREVIVENTES
Silvana foi agarrada violentamente por trás. O Maníaco do Parque segurou-a pelos cabelos e a obrigou a fazer sexo oral nele. “Coloca isso na sua boca, vaca!”, ordenou. Enojada, Silvana deu uma mordida tão forte no pênis flácido do patinador que sua mandíbula ficou toda ensopada de sangue.
Gritando de dor, ele começou a esmurrar o rosto dela para fazê-la soltar seu órgão sexual… Silvana se levantou rapidamente e pegou a máquina de escrever da sacola…
Em pé, perto dele, levantou a Olivetti para o alto usando as duas mãos e arremessou o equipamento pesado com toda a sua força na cabeça do agressor, estourando sua orelha esquerda…
Em abril de 2023, aos 48 anos, formada em Ciências Sociais, Fabiana deu o seguinte depoimento: “Fui humilhada não só pelo que aconteceu no meio do mato, mas também pela atitude dos policiais e pela reação das pessoas no ponto de ônibus.
Quando o PM me perguntou como eu havia entrado no parque, caiu a ficha: achei que tinha sido muito idiota de ter caído na lábia daquele monstro…
Fui humilhada não só pelo que aconteceu no meio do mato, mas também pela atitude dos policiais
Em casa, veio a vergonha intensa. A depressão ficou severa. Acabei internada numa clínica psiquiátrica. Perdi o emprego, terminei meu noivado. Só consegui recomeçar a vida três anos depois desse psicopata ser condenado.
Num documentário sobre o maníaco, vi o psiquiatra Guido Palomba dizer que as vítimas tiveram uma parcela de culpa, pois aceitaram o convite dele com facilidade. Muita gente pensa assim.
Em nossa defesa, tenho algo a dizer: Francisco era um homem extremamente sedutor… Quando diz que possuía a habilidade de identificar mulheres vulneráveis no meio da rua, ele não está mentindo. A forma como ele sorria, elogiava… Sua verdadeira face só aparece mesmo quando ele se transforma numa fera dentro da floresta…
Chico não estava mais com o semblante afável de momentos atrás. Os olhos arregalaram-se, arqueando as sobrancelhas grossas. A parte branca do globo ocular ficou avermelhada. As pupilas dilataram-se.
Abriu a boca como se fosse um animal silvestre, revelando dentes triangulares e pontiagudos, não perceptíveis antes…
Aterrorizada, Pituxa deu meia-volta e correu pela trilha, soltando gritos de terror. Era impossível alguém ouvi-la no meio daquele matagal.
CANIBALISMO E NECROFILIA
Quando terminou, o corpo de Selma lembrava os bois do matadouro Bordon [onde ele trabalhou] logo após receberem a primeira marretada. Em seguida, Francisco pegou o pedaço de madeira usado para espancar a vítima e o introduziu inúmeras vezes no ânus e na vagina da moça.
Enquanto fazia esse movimento, o maníaco se masturbava. Depois de ejacular, cravou dez mordidas no cadáver: no ânus, na vulva, nos seios, nos ombros, no abdome, nas coxas e na panturrilha. Das partes moles do corpo, chegou a arrancar pedaços de carne e engolir.
NAS BARBAS DA POLÍCIA
O mais impressionante na trajetória do maníaco é que ele poderia ter sido detido muito antes de matar sua primeira vítima. Sua ficha criminal já incluía uma tentativa de estupro registrada na delegacia de São José do Rio Preto, em 1995.
Dois anos depois, outra jovem foi à 1ª Delegacia da Mulher da capital para denunciar que havia sido violentada no meio do mato por Francisco. Seis dias após assassinar Isadora Fraenkel, em 1998, o motoboy foi chamado ao Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa para explicar os saques da conta corrente da vítima.
Francisco de Assis teve sua carreira de assassino interrompida graças a uma de suas vítimas. Ele já havia matado três mulheres, quando uma vendedora das Lojas Brasileiras se recusou a ir ao parque no momento em que foi abordada, no centro de São Paulo. O motoboy lhe deu o número de telefone e desapareceu.
Duas outras vítimas foram à delegacia fazer o retrato falado do assassino, publicado na Folha em 12 de julho de 1998.
Ao ver a imagem do maníaco, a vendedora foi à polícia entregar o contato do criminoso. Francisco deu um baile na polícia. Só foi capturado 21 dias depois no Rio Grande do Sul.
FILHO DO DEMÔNIO
João afirmou que Tim [como Francisco é tratado em família] era filho de Asmodeus, uma criatura demoníaca destinada a matar mulheres…
O bruxo, enfático, disse que “as mulheres não valem o chão imundo que pisam” e explicou que Francisco veio ao mundo por encomenda do Demônio, por isso era rejeitado por sua própria família…
Na despedida, João pediu que o neto sumisse de Ribeirão Preto. “Esqueça a sua família e caia no mundo. Você é uma pessoa iluminada e ainda será muito famoso”, profetizou.
Esqueça a sua família e caia no mundo. Você é uma pessoa iluminada e ainda será muito famoso
ESTUPRO NO EXÉRCITO
O grupo avançou sobre o soldado 998, arrancando-lhe as facas e toda a roupa… Um foco de lanterna iluminou o pênis totalmente enrugado de Tim, evidenciando sua fimose secundária. Houve gargalhadas de escárnio…
Na sequência, Tim foi estuprado violentamente por cinco homens não identificados… Sofreu lesões graves no ânus, lacerações extensas, hematomas, edemas e hemorragia intensa…
Francisco de Assis Pereira integrou o efetivo do 39º BIMtz de 3 de fevereiro de 1986 a 1º de março de 1988. O Comando Militar do Sudeste informou não existir nenhum registro sobre o estupro coletivo que Francisco relatou ter sofrido durante o treinamento em São José dos Campos.
VIOLÊNCIA NA PRISÃO
Depois de 36 horas, a rebelião foi contida [na Casa de Custódia de Taubaté, em 2001]. Um grupo de bandidos, liderado por Pedrinho [Matador], chegou a invadir a cela onde Francisco se escondia e o espancou, quebrando parte de seus dentes.
“Não posso te matar, mas você vai apanhar até chegar na porta do inferno, seu estuprador”, disse o matador, enquanto chutava o motoboy. Segundo relatos, o maníaco teria tido suas roupas arrancadas à força e sofrido violência sexual com um cabo de vassoura.
AMOR POR CORRESPONDÊNCIA
“Querido Francisco, quando esta carta chegar às suas mãos, espero que esteja em paz. Acompanhando o noticiário, soube da sua trajetória. Desde então, passei a sentir algo profundo e inexplicável por você. Mesmo conhecendo as acusações, meu instinto me diz que sua alma é bonita…
Sou uma mulher experiente, tenho posses, mas sou sozinha…Anseio profundamente poder visitá-lo na penitenciária… Com afeto e esperança, Jussara.”
Filha de empresários, divorciada e sem filhos, magra, loira e sardenta, Jussara havia recebido uma herança generosa dos avós e dos pais… Solidária e apaixonada, ela passou a contribuir financeiramente com a família do motoboy.
Jussara contratou advogado para entrar com o pedido de visita íntima. A Justiça não autorizou. Ela levou a notícia ao motoboy, avisando que, sem sexo, não poderia continuar o namoro: “Já pedi ao advogado para anular nossa união estável”.
Ao se despedir, Francisco pediu um último beijo. Ao se aproximar pela grade, tentou dar uma dentada no pescoço dela, que saiu correndo.
Na semana seguinte, Francisco reatou com Maria Rita. Namoraram por mais três anos, até que ela foi interditada pela família por problemas mentais.
A dona de casa de 47 anos viu uma reportagem sobre o julgamento de Francisco. Segundo relatou em uma carta, ela sentiu um amor arrebatador por ele.
Na época, somente a mãe do criminoso via o filho a cada 30 dias… Maria Rita procurou Maria Helena e ofereceu dinheiro para que ela saísse da lista. “O amor que sinto pelo seu filho é mais forte do que a vida.”
Após um acordo, Maria Rita conseguiu uma carteirinha de visitante e passou a namorar Francisco dentro da penitenciária.
Apesar do relacionamento, o maníaco começou a manter namoro simultaneamente com outras mulheres por correspondência.
Atualmente, apenas uma “amiga” luso-brasileira de 49 anos está autorizada a visitá-lo. Sem visitas de parentes há 10 anos, alterna rotina na prisão fazendo crochê, lendo cartas de mulheres apaixonadas e frequentando cultos da Igreja Universal.