Foi durante um banho de mar na Barra da Tijuca que os astros se alinharam e investiram em mim. Tem tempo isso. Mais de trinta revoluções solares atrás, a contar pela moeda corrente daquilo que veio boiando na minha direção: uma nota de Cr$ 500.
Eram tempos de hiperinflação e Plano Collor. Ninguém mais sabia quanto valia o quê. Dinheiro que hoje estava seguro, amanhã babau. E eu ali, faturando o troco de um banhista que, provavelmente, deu um tchibum com a sunga frouxa demais.
Já na banca de jornal da orla, confirmei que aquela bufunfa não comprava quase nada. A não ser um intrigante suplemento ilustrado, cujo título era “Astrologia Divertida de Will Eisner”. O preço? Coisa do destino: exatos Cr$ 500.
Fazendo valer cada centavo, esse ídolo dos quadrinhos me arrancou gargalhadas com as supostas características de cada signo. Da larica eterna dos taurinos ao fogo dos nativos de satanáries. Do avoamento dos piscianos à múltipla indecisão dos librianos, passando pela falta de concentração —e o que mesmo?— dos geminianos.
No traço simpaticão do sr. Eisner, tudo era leve e gracioso, despertando assim a adolescente new age que eu nem sabia ser. “Esoterismo é coisa de escorpião”, me falaram na época. Corta para: horóscopo e dedo na cara. “Cinismo! Isso, sim, sirigaita, é coisa de escorpião!!!”.
Não é possível. Vocês também repararam, não? Ultimamente, um azedume zodiacal eclipsou o ocultismo moleque, o misticismo risonho e franco. Estacionando certezas absolutas no meio do céu de amigos, vizinhos, peguetes e Márcias Sensitivas em geral: tudo o que você disser não só pode, como será usado num mapa astral contra você.
“Ai, que gênio difícil. Você é aquariana? Sabia…”. “Fazer loucuras debaixo do edredom com leonino? Jamais! Sou de virgem.” “Sim, claro, seu currículo é ótimo, mas veja bem: no momento não estamos contratando sagitarianos com lua em câncer.”
Não importa o que você faça, nem o desorientado das estrelas que seja. Nada mais vai configurar tristeza, mau jeito, piripaque ou pindaíba —será culpa do seu signo. Pior: do seu ascendente. No meu caso, capricórnio. “Cruzes, o que só pensa em dinheiro!”. Até parece: eu e os astros estamos dando um tempo do destino. Tenho achado nem moeda em bolso de calça pra lavar. Coisa de escorpião, né?
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