O recado da pira olímpica para o G20 – 30/07/2024 – Assim Como Você

Esses dias olímpicos têm me feito pensar que alguma nova engrenagem de entender a vida, que vem sendo construída por décadas, foi acionada e empurra a gente para novos tempos, finalmente.

Para ficar apenas no acendimento da pira francesa, atletas com e sem deficiência, negros e brancos, homens, mulheres e demais identidades de gênero e um velho em uma cadeira de rodas protagonizaram ao mundo o desenho de um óbvio e dificílimo valor a ser compreendido: o de que viver é plural.

Embora se invisibilize a ausência de diversidade em grandes eventos e se dê muito holofotes para uma polêmica vazia sobre uma suposta representação da Santa Ceia, cheia de gente variada, durante a abertura dos Jogos, para quem reza a ladainha dos diversos sente que o momento é decisivo.

Na TV, nas propagandas, nas discussões do bar e, evidentemente, nas competições, o clima é o de “ninguém fica de fora”, agora é todo o mundo junto e de mudança na forma de olhar, entender e atuar diante manifestações multicoloridas.

Mas o que esse preâmbulo tem a ver com um dos maiores eventos financeiros da Terra, o encontro de líderes do G20, que acontece no Rio, em novembro?

É que a reunião de líderes globais irá receber do Estado brasileiro uma documentação incômoda a ser encarada e impossível de ser adiada, o poder público não abarca em seus quadros e em sua estruturação, de maneira olímpica e paraolímpica, a diversidade.

Um evento preparatório ao encontro das nações ocorreu dias atrás, promovido pelo Ministério da Gestão, que tem adotado o discurso de fazer uma transformação no serviço público. Encarar que muita gente está de fora da condução de um país na esfera pública, é um começo.

Em uma mesa com formato em U, no poderoso BNDES, vozes vindas de representantes de grupos subjugados de toda ordem se espremiam atrás de espaço para contribuírem com o futuro, para mostrar que da mesma forma como meninas negras e de comunidades conseguem medalhas inéditas, elas podem e devem premiar o Brasil desempenhando funções públicas.

Mesmo que demandas muito basilares tenham sido erguidas —e não diretamente ligadas ao centro da discussão de fazer o setor público mais diverso—, como a garantia de terras pelos povos originários, lei de proteção à mulher contra violências variadas e acesso a quem não consegue sequer chegar para discutir, o caldo gerado tem sustância para empurrar mudanças.

De alterações na forma como são conduzidos e preparados os concursos públicos a redefinições e ampliações para as cotas, a tônica do debate foi que há terreno vasto de possibilidades para contemplar justamente quem tem ficado de fora das entranhas dos Estados, dos pódios de tomar decisões coletivas.

O que foi uníssono no encontro é que não há desenvolvimento possível no mundo moderno sem que haja participação de corpos diferentes, ideias diferentes, manifestações diferentes. Também que o devido protagonismo a negros, LGBTQIA+, neurodivergentes e uma porção de outras gentes é urgente e que nada justifica a demora disso na esfera pública.

Oxalá o espírito olímpico de Paris embale o espírito público do Rio, que pode tomar decisões de medalhar milhares de pessoas.


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