Há medidas duras no pacote (sim, las hay), mas o governo tem feito de tudo para escondê-las. A lógica invertida da comunicação parece ser: o que é bom para ajudar no equilíbrio das contas públicas a gente esconde.
O anúncio errático do pacote fiscal do governo ofuscou as medidas mais fortes de reforço da sustentabilidade das contas públicas.
E, inexplicavelmente, não há até agora correção do rumo da comunicação das propostas pelo governo. Em outros momentos do passado, o fracasso da estratégia teria provocado demissão na certa.
O resultado são dias seguidos de dólar acima de R$ 6 e a pergunta ainda sem resposta: afinal, qual será a notícia que fará a cotação da moeda americana recuar para um patamar abaixo desse valor?
Qual seria o momento da virada? O aperto maior dos juros pelo Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central?
No mercado, se encontra todo tipo de resposta. Desde anunciar um corte “na carne de despesas” em 2025, se comprometer com um resultado primário sem abatimentos da meta fiscal, mudar o piso da educação e saúde, entregar um superávit de R$ 25 bilhões no ano que vem, desistir oficialmente de mandar o projeto de aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda até R$ 5.000 até uma medida de maior revisão do abatimento das despesas médicas.
Como já se passaram dez dias do anúncio e nenhuma declaração de autoridades do governo mudou o rumo da prosa, está em gestação um novo balão de ensaio.
Forma-se a expectativa de que o Congresso irá “salvar” o pacote nas duas semanas que faltam de votação até o recesso parlamentar.
Alguns integrantes da área econômica têm alimentando a percepção, em conversas fechadas com agentes do mercado financeiro, da viabilidade de aprovação de propostas que estariam sendo discutidas com o Congresso para aperfeiçoar o pacote.
Entre as medidas sugeridas, um gatilho limitador do crescimento do salário mínimo (com efeito só em 2027) e aperto das regras do BPC (Benefício de Prestação Continuada) para idosos e pessoas com deficiência.
Corre-se o risco de nova frustração, enquanto parlamentares só querem mesmo é resolver o deles: liberar emendas deste ano e garantir uma fatia gorda do ano que vem.
Falar em endurecer as regras do BPC é ignorar que há no pacote um aperto das regras de acesso ao benefício. As mudanças não foram sequer detalhadas pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, de Wellington Dias. Quando fala do assunto, Dias só repete que a proposta não tira direitos.
Mas, nas medidas do BPC do pacote, há restrição de acesso em relação ao critério de renda, ao conceito de deficiência e a contabilização da renda de outro benefício —propostas que podem ser desidratadas no Congresso.
A PEC do ajuste fiscal deu poder à equipe econômica do governo de contingenciar despesas do Orçamento de forma preventiva para cumprir o centro da meta fiscal. Outra medida de reforço dos bloqueios de despesas, que pode cair na votação do Congresso.
O que o governo precisa fazer agora, necessariamente, é construir as condições políticas para votar o que mandou e anunciar rapidamente o redesenho do programa de auxílio-gás com a despesa para pagar o benefício dentro do Orçamento.
Um remendo no pacote pode não só custar caro como não ser eficaz.
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