Para resolver 2024, Lula contrata dificuldade para 2025 – 27/11/2024 – Vinicius Torres Freire

A preocupação do governo Lula de evitar danos de imagem com o plano de contenção de gastos é muito maior do que se imaginava. É tamanha que ministros não se importaram de dizer que a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil seria amarrada no dito pacote fiscal. Com o novo IR, o governo terá de caçar receita em volume equivalente ao que talvez economize com o pacote. O governo não se deu conta de quanto pode minar as chances de ter dólar, juros e inflação menores em 2025.

O que vai entrar por uma porta pode sair pela outra: o governo pode mostrar que foi “duro” com os mais ricos também. Mas logo pode ver os mais pobres padecerem os efeitos práticos do descrédito fiscal, como inflação em alta, o pior, ou crediário mais caro, economia esfriando etc.

Em resumo, o governo contratou um problema novo para 2025 antes mesmo de começar a atenuar as dificuldades já evidentes em 2024: a descrença na sobrevivência do arcabouço fiscal até 2026.

A parte menos imprevisível do pacote dependeria, é claro, de aprovação do Congresso. Quem sabe ficasse para o início de 2025, uma incerteza (o que vai ser aprovado) dentro da outra (quando vai ser aprovado). Agora, o governo corre para a beira do precipício em tempos de névoa. O precipício: ter de arrumar ainda mais receita nova para 2025 quando não sabe nem ao menos como tapar o rombo fiscal já evidente. A névoa: o mundo também econômico vai ficar um lugar muito mais perigoso sob Donald Trump.

A isenção do IR demandará no mínimo compensações de R$ 35 bilhões a R$ 45 bilhões —isso se houver mudança sensata na tabela de valores ou também de alíquotas do IR para pessoas de renda maior. É quase o tamanho da contenção de despesa prevista para o pacote de 2024.

De onde vai vir a compensação? De imposto sobre mais ricos? Seria bom. O Congresso vai aprovar? Parlamentares ficam muito mais felizes em dar dinheiro do que de cobrar. Vai funcionar? Mudança de alíquota não tem sempre resultado previsível na arrecadação. Os contribuintes adotam estratégias tributárias ou de negócios de modo a evitar impostos maiores (legalmente, neste caso. Não se trata aqui de fraude, que também existe claro).Ou seja: a perda de receita com a isenção do IR é certa. O aumento da arrecadação, não.

O problema maior não é, claro, o paniquito nos mercados financeiros, dólar e juros dando passeios em novas alturas da estratosfera neste ou naquele dia ou semana. A depender do dia depois de amanhã, os preços podem até refluir. A questão é como lidar com o fato elementar de que haverá novos problemas para resolver a fim de evitar descrédito maior do arcabouço fiscal e de conter a crença de que a dívida pública crescerá sem limite. Trocando em miúdos grossos, trata-se de evitar que dólar e taxas de juros aumentem de modo crítico.

Há meios de fazer com que as coisas funcionem. O crescimento da economia neste ano pode ser maior do que os 3,3% ora previstos pelo ministério da Fazenda. Os economistas do Bradesco divulgaram sua revisão de cenário nesta quarta-feira: alta do PIB de 3,5% neste 2024 e de ainda razoáveis 2,4% em 2025 (de 2017 a 2019, pós-recessão e antes da epidemia, média de 1,4% ao ano). A receita de impostos aumenta. Poderia ser um momento de tranquilidade fiscal, de contenção da dívida pública, que, no entanto, sobe sem controle. Pode ser, porém, um momento de realimentação do mal estar.


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