Aguinaldo Silva, autor de “Tieta” (1989), “Império” (2014) e outras grandes novelas, falou aqui (8/7) sobre a situação atual do gênero. “Os autores da minha geração [Gilberto Braga, Manoel Carlos e outros] eram ativistas, jornalistas, pessoas da rua. Tinham uma forte experiência de vida”, afirmou. “Os de hoje são pessoas de classe média, que não tiveram uma vida anterior.”
Concordo com ele sobre a importância dessa experiência. É o que tenho dito há anos sobre a prática da biografia.
Perguntaram-me certa vez o que era preciso para que alguém se tornasse um bom biógrafo. Respondi que deveria ser alguém que talvez também rendesse uma boa biografia. Na minha cabeça, ele não teria saído do casulo livresco ou universitário, mas de onde, como foi com Aguinaldo, se cria uma casca grossa para a vida: a rua. De preferência à noite, que é quando as coisas acontecem.
Na minha concepção, isso inclui ter frequentado tanto os palacetes quanto os porões, conhecido toda espécie de gente e corrido da polícia ou de algum marido. Ter amado e sido amado, traído e sido traído, usado o permitido e o proibido. Se possível, sido preso (por motivos políticos, melhor), processado, tido uma doença grave, ter morrido e ressuscitado.
Não quero dizer que sejam itens obrigatórios —outros atributos podem valer tanto quanto—, mas o biógrafo não pode ser um poste limitado a ouvir respostas. Às vezes, terá de arrombar gavetas, assim como a memória dos entrevistados. Não significa também que, por ter tido uma vida pessoal ativa, vá se meter na história e ficar falando de si no livro. Sua experiência servirá apenas para que faça melhores perguntas, descubra pistas invisíveis e não se deixe tapear pelas fontes.
Importante: o biógrafo não pode querer ter sido o seu biografado —por mais que ele seja fascinante e se chame Nelson Rodrigues, Garrincha ou Carmen Miranda.
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