O debate sobre a reforma da tributação da renda tem se baseado na ideia de reduzir as alíquotas dos dois impostos incidentes sobre o lucro das empresas (IRPJ e CSLL) em troca da retomada da tributação de dividendos distribuídos aos seus sócios, a exemplo do que fazem outros países.
O Brasil de fato chama atenção nas comparações internacionais por ser um dos poucos países do mundo que isentam dividendos ao mesmo tempo que tem uma alíquota nominal sobre o lucro das empresas mais alta do que na maioria das economias desenvolvidas.
Mas o que ocorre quando somamos as tributações ao nível da empresa e do acionista? Os dados mostram que a carga tributária nominal sobre lucros no Brasil (34%) é inferior não só à média da OCDE (42%), mas também inferior aos quatro países latino-americanos que integram esse seleto grupo de países.
Na Colômbia, um dos quatro latinos da OCDE, a tributação do lucro nas empresas é hoje de 35%, superando inclusive o patamar brasileiro, e quando se soma ao imposto cobrado dos acionistas pode chegar a uma alíquota de 48%. No Chile, essa mesma carga chega a 44,5%, no México a 42% e na Costa Rica a 40,5%.
Curiosamente, tanto a Colômbia como o México isentavam dividendos distribuídos aos acionistas há duas décadas, mas ambos países, além da Grécia, revisaram esse tratamento privilegiado e passaram a adotar uma tributação adicional sobre os lucros distribuídos que varia de 15% a 20% —exatamente como era o plano da Receita Federal para o Brasil previsto em um projeto de lei enviado ao Congresso pelo ex-ministro da Economia Paulo Guedes.
Quando computamos a tributação total dos lucros e comparamos o Brasil com os 38 integrantes da OCDE, verificamos que a carga tributária do Brasil sobre lucros está na 33º posição. Ou seja, apenas meia dúzia de países do Leste da Europa apresenta tributação menor do que a brasileira, como é o caso da Estônia e Letônia, únicos países da OCDE que mantêm ainda hoje a isenção.
Por outro lado, a Irlanda, que é um dos países com a menor alíquota de IRPJ do mundo (12,5%), como forma de atrair empresas estrangeiras ao seu território, tributa os dividendos distribuídos em até 51%, registrando uma carga tributária total sobre lucros que pode chegar a 57,1%, a segunda maior da OCDE.
Se por um lado a alíquota sobre lucro das empresas no Brasil é alta e deve ser reduzida por razões de competição internacional (como mostra o exemplo irlandês), por outro vemos que, no cômputo global e quando nos comparamos ao resto do mundo, há espaço para tributar os dividendos sem risco de afugentar investidores.
O ideal é que se consiga reduzir as diferenças de alíquota efetiva entre os diferentes setores econômicos para diminuir a alíquota nominal para um patamar mais baixo do que os 34%, sem perder muita arrecadação. Junto disso, é claro, temos de voltar a debater o retorno da tributação de dividendos.
Se o presidente Lula (PT) não enfrentar esse debate agora e ceder às pressões, corre o risco de terminar seu terceiro mandato sem fazer a mais importante de todas as reformas em termos de justiça tributária. Essa agenda não é incompatível ao corte de gastos. Ela é complementar, inclusive por incluir a redução dos chamados gastos tributários (incentivos).
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