STF deve requalificar seus processos para julgar trama golpista – 29/11/2024 – Oscar Vilhena Vieira

O Supremo Tribunal Federal terá o enorme desafio de decidir sobre o destino dos envolvidos na bizarra trama golpista, descortinada pela Polícia Federal. Os prováveis réus são militares radicalizados de alta patente, além do ex-capitão Jair Bolsonaro que, ao longo de todo o seu mandato como presidente, nunca perdeu uma oportunidade para atacar o Supremo e os seus ministros, assim como incitar os militares e os seus apoiadores contra o tribunal.

Embora um tribunal jamais deva temer ou se curvar à opinião pública ou a dos poderosos, o exercício da pesada tarefa de aplicar a lei depende do reconhecimento de sua autoridade por parcela significativa da sociedade, especialmente por parte daqueles atores políticos e institucionais que interagem com os tribunais. A autoridade judicial está diretamente associada à sua capacidade de demonstrar imparcialidade, honestidade, objetividade, eficiência, coerência e consistência na aplicação da lei. Mas, também, à sua disposição de não se curvar aos poderosos.

Nesse contexto, penso que a melhor maneira do Supremo enfrentar esse novo desafio que lhe está sendo apresentado, seja requalificar seu processo decisório. Aliás, isso seria fundamental não apenas para o julgamento de eventuais golpistas, mas também para o exercício ordinário de sua jurisdição, num ambiente em que parece não haver questão relevante da vida nacional que não passe pelos gabinetes do Supremo.

Cito abaixo algumas ideias – que vêm se tornando consensuais entre muitos que acompanham a vida do Supremo – voltadas a fortalecer a autoridade do Supremo, deixando-o menos vulnerável às ameaças apresentadas pelos inimigos da Constituição, mas também às críticas honestas daqueles imbuídos em qualificar a sua missão de guardião da Constituição:

1. Colocar fim a decisões monocráticas. O Supremo recebeu a enorme responsabilidade de dar a última palavra sobre importantes questões de natureza constitucional. Esses poderes foram atribuídos ao tribunal, por meio de seus colegiados, para reduzir o risco de vieses e preferências nos julgamentos. A jurisdição conferida ao tribunal não pode ser apropriada individualmente pelos ministros, sob qualquer pretexto. Não é verdadeiro o argumento de que isso paralisaria o Supremo. Tribunais funcionais ao redor do mundo exercem suas funções sem transferir seus poderes aos seus membros;

2. Ampliar segurança jurídica. O Supremo precisa ser capaz de estabilizar sua jurisprudência e fazer com que ela sirva de guia para as demais instâncias judiciais e para os jurisdicionados. Para isso, seria importante que suas decisões (além de colegiadas) representassem não apenas uma somatória de votos individuais, mas uma autêntica opinião da corte ou de sua maioria. Mais do que isso, essas decisões deveriam demonstrar estrita congruência à legislação e consistência com os precedentes do próprio tribunal. A falta de objetividade e inconsistência gera a percepção de uma justiça arbitrária, o que é uma contradição em termos;

3. Por fim, é necessário que o Supremo adote um código de conduta, que auxilie os ministros a transmitir uma imagem de imparcialidade e comedimento, indispensáveis ao exercício da função que lhes foi atribuída.

Embora as maiores ameaças ao Supremo venham dos inimigos da Constituição, suas maiores fragilidades vêm de seu próprio processo decisório, sobretudo, da fragmentação de sua jurisdição.


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