Todo evangélico é fundamentalista? Um historiador diz que sim – 02/09/2024 – Juliano Spyer

O que significa o termo “evangélico”? Como conectar os evangélicos ao longo dos séculos? E como três historiadores dificultaram a compreensão da relação entre cristianismo e extrema direita ao desvincular o evangelicalismo de seu contexto social?

Essas e outras questões são examinadas pelo historiador norte-americano Matthew Avery Sutton em seu artigo “Redefinindo a História e a Historiografia do Evangelicalismo Americano na Era da Direita Religiosa” (“Redefining the History and Historiography of American Evangelicalism in the Age of the Religious Right”).

O artigo foi publicado recentemente no Journal of the American Academy of Religion.

Matthew Sutton apresenta duas premissas.

1) Nos anos 1980, líderes da direita religiosa alegavam que os Estados Unidos foram fundados como uma nação cristã, justificando o nacionalismo cristão.

2) Em resposta, os historiadores Mark Noll, Nathan Hatch e George Marsden desenvolveram uma historiografia positiva para proteger a reputação dos evangélicos.

Segundo Sutton, esses três historiadores definiram “evangélico” apenas com base em ideias teológicas, ignorando práticas, redes de relacionamento e posições sobre racismo e desigualdade de gênero e de classe.

Mesmo pertencendo a um grupo minoritário de protestantes do nordeste dos Estados Unidos e sem preparo para analisar o cristianismo em outras regiões, especialmente no sul escravista, esses historiadores celebraram “evangélicos” abolicionistas, pioneiros na educação, defensores dos direitos das mulheres, reformadores urbanos, ativistas trabalhistas e missionários que promoviam liberdade religiosa e direitos humanos globalmente.

Sutton argumenta porém que essa abordagem minimizou o aspecto político da religião.

“Em vez de explicar como o evangelicalismo se tornou um aliado da direita republicana, alegaram a existência de um ‘verdadeiro’ evangelicalismo separado de suas manifestações políticas”, escreveu o historiador.

Matthew Sutton sugere que, no século 20, cristãos fundamentalistas adotaram o termo “evangélico” para se apresentar como “guardiões da Reforma Protestante.” Eles entendiam que “Deus tinha um plano específico para os Estados Unidos e que seu trabalho era garantir que os verdadeiros cristãos executassem fielmente esse plano.”

Por isso, Sutton conclui que o termo “evangélico” deve descrever um movimento pós-Segunda Guerra Mundial que é “religioso, nacionalista, patriarcal e branco”. Outras características existem, mas são específicas de certas denominações e de contextos específicos.

Sutton propõem em seu artigo uma reflexão acessível ao leitor não especialista no assunto sobre como a história pode produzir mitos.

E oferece um ponto de partida para historiadores brasileiros examinarem um fenômeno que, na próxima década, deve se tornar predominante aqui no Brasil.

spyer@uol.com.br


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